quinta-feira, 20 de setembro de 2012

A casa e da(s) infância(s) II

Fim do séc. XVIII e início séc. XIX, região serrana do ES
Para continuar essa analítica da casa e da infância, deve-se olhar atentamente a imagem anterior. A casa mostra a infância em diversos modos, insclusive, muito além dos descritos nesses trechos enunciativos compreendidos por mim. Na outra imagem (vide postagem anterior) há outras famílias e há outras crianças que golpeam os modelos hierárquicos e classistas, exatamente, da sua (tácita) condição pictórica. Sem muito esforço. Pois, não há o que denunciar, já que o cuidado, a responsabilidade, necessariamente, não implicam as retóricas, as dialéticas, ou as meras correlações analógicas do tipo casa/instituição. Mas, o privado, assim como a escola, no modo em que se autointitulada pública, pode depor lógicas e racionalidades que, em clara distinção, propalam formass práticas e políticas, isso é verdade; ou seja, o receptor e o leitor não compreenderão as crianças e as infâncias se não transcenderem tais paradígmas epistemológicos, ou, as patologias genéticas, as patologias sociais, o enquadramento do infantil na instituição, na aquitetura, enfim, na casa, na ética e na pólis.
3 - Saberes da infância na ótica do privado:  A casa sem paredes, tem estrutura, revela os lugares, supõe a visão do habitáculo, decifra ambientes corpóreos, relacionais, processuais. A privacidade familiar, hierárquica, no desenho bem horizontal ao longo das linhas que se sobrepõem às cabeças, dando uma curvatura do maior para o menor, do etariamente mais velho para o mais novo, e vice-versa, tudo isto, põe em decurso prático as simbologias e os modelos funcionais da realidade privada familiar. O gênero presente, meninos perto dos meninos, alinhavados, meninas encadeadas, homem e mulher. Por efeito, (i) pode se empreitar o modelo patriarcal (Freyre) em torno da casa; (ii) pode problematizar a visão híbrida eurocêntrica e colonialista (do fotógrafo alemão e da forma historiográfica narrativa, do fim do século XVIII); (iii) pode se golpear, fissurar, deslizar, desviar a imagem para o inapreensível, o aberto e o não determinado; (iv) pode se enviezar na infância que não se dilui, não se narra, não se paralisa na imagem, na representação e no livro-escrito, mas que é também produção da imagem, da representação e do livro. Só que a lógica do privado, aqui, muito mais visto se nas ações externas à paralisia fotográfica (Arendt, ação e comunicação) colocada, por sua vez, depõe também um ensaio sobre o sentido público, isto é, da lógica econômica em torno da família (dos funcionaríos olhando o acontecimento, tocando os animais, cultivando a terra, etc.), da espacialidade extendida e comprimida de dentro para fora e de fora para dentro, através aqui das liberdades recolhidas ao espaço e das negociações, dos afazeres e dos tecidos acordados para ampliação do mundo, cuidado do mundo e determinação do mundo. Na verdade, é público as formas, os atos, os acordos, as parcerias que ensaiam tal ampliação e adentramento mundano.

A casa da(s) infância(s) I

Fim do séc. XVIII e início séc. XIX, região serrana do ES
A imagem é inspirativa. Não somente isto. O fotógrafo, como o historiador, enuncia, supõe o recptor, irradia uma panorâmica. Busco aqui a brincadeira de criança e a beleza do desenho infantil a fim de tecer algumas coisas em torno da casa. Certeau (2007; 2012), certamente, delata a sentido inapreensível do escrito, que golpea o flagrante olhar, a desenhar, a escrever, refletido pelo inusitado. Desse modo, a infância é sempre mais ou menos um pouco de cada uma destas coisas, ou melhor, deve equacionar algumas outras: como olhar o que não foi visto, dizer o que não foi dito, escrever o que não foi escrito? Portanto, desta imagem-casa surgem provocações importantes e saberes. A casa está por perto, próxima, familiar e é nuclear à família/sociedade. Assim, Freyre (1998) - e à crítica freyriana - decompõe universalismos e ideologias tacanhas e estruturantes da realidade (colonialista brasileira) a partir da casa, aliás, a casa-grande, se comporta modelos, microcosmos, hierarquias, economias, de fato, cotempla os (a)fazeres da casa.
1 - A criança compõe o mundo: a imagem da composição do artista, que se autointitula artista fotográfico (Ervin Kerckhoff, 1886-1972), coloca o autor, o enunciador, mais ou menos, com o olhar do pintor; portanto, o guadro surge através de certa imaginação. Contempla certos processos recptores. Enfim, isto me lembra a descrição de Foucault (2007) a partir do pintor Velásquez. Tem-se aí o modelo, o guadro, e também a ausência. Modeos e ausências, analogamente, nesta imagem, tecem a representação do mundo, da casa, do ambiente. E se se interessa em ver a representação da criança como configuração e composição do mundo, então, ela surge como sujeito, a criança, o indivíduo familiar. Surge também como a compositora de sentidos, barulhos, preenchimentos, inclusive, dos lugares privados da casa, dos recantos das roças, das relações com os bichos, da irrupções fronteiriças e limitadas pelas cercas, até mesmo o paladar, o cheiro e a marcação territorial com seus próprios pés. Sua voz torna-se audível e concreta!
2 - O mundo da criança é assim inventado: penso aqui, desta imagem e representação, que a questão de Wartofsky (1999) sobre Quem constrói quem - o mundo a criança, ou a criança o mundo? pode inserir o epicentro de uma representação (pedagógica), a escrita, a imagem, a representação, ou melhor, a escrita do sujeito e sua relação com o livro-experiência, a escrita do sujeito e do livro-imagem, enfim, o que se coloca nessa configuração é um outro sentido, como as coisas, as formas, os objetos, as próprias imagens e representações em torno da criança são produções-discursivas, produções-imagéticas e pictóricas, enfim, essa lacuna ou esse estranho olhar deve remeter a ideia de invenção da infância, via uma narrativa fotográfica. Nesse caso a autoria, a ordem, o guadro, pode tecer outros olhares e sentidos, inclusive, o não-visto, o não-dito, o não-escrito e até o não-representado. Tal proposta problematiza as teorias, as metodologias, as pesquisas e as produçoes, todas, pois, são os desafios contemporâneos.

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Para uma Sociologia da Infância verde-amarela



As crianças e infâncias indígenas do Brasil
E a criança do Brasil? E a infância do Brasil? As perguntas se levantam como protesto junto ao modismo dessa imagética (representação) eurocêntrica das crianças e infâncias. Dominam eles os saberes também dos infantes? Ironia a pergunta que por si oculta a suposta hegemonia de dominação dos saberes dos adultos! Está correto Boaventura (2010) destacar que há muitas epistemologias além da Europa, lógico, há as epistemologias do sul, e elas precisam ser resgatadas, inclusive, como projeto político. Então há duas coisas a se considerar relativas às culturas infantis com a educação: primeiro, uma questão óbvia, pois, as crianças e as infâncias brasileiras se diferem das européias e; segundo, quais crianças e infâncias tais epistemologias à brasilidade pode fazer surgir? Essa última equação não é mais fácil que a primeira, pois, há poucas tentativas densas nesse campo da sociologia da infância verde-amarela. As culturas infantis brasileiras estão de algum modo “invisibilizadas”. Deve-se apostar nas literaturas espertas, molecadas, lúdicas e claudicantes nos diversos espaços e tempos brasileiros. Talvez, venha dos clássicos, como Freyre, Holanda e Prado Jr, alguns dos bons resquícios para ampliar a discussão à proporção que contribuem para racionalização da formação social de nosso país. Talvez seja melhor se deparar com o folclore e a cultura infantil em Florestan (As trocinhas do Bom Retiro), pelo menos, ele deixa um texto que pode ser borilado com maior propriedade. Talvez seja possível correlacionar à representação histórica-social da infância brasileira com o que a filósofa Chaui (2004) descreve sobre o mito fundador: “o mito fundador é construído sob a perspectiva do que o filósofo judeu-holandês Baruch Espinosa designa com o conceito de poder teológico-político.” Quem sabe é por isso que há tantos nichos e rituais religiosos e disciplinares afagando a almas dos atores da educação, em nome da salvação das crianças! Aumenta-se, portanto, nesta hipótese, a ideia de infância brasileira mais distinta da européia, com certeza. Já pode ser um bom caminho. Ou, quem sabe, certamente, virá da Cecília e do Drummond um brinde acolhido com a estética da infância e com a poética das crianças. Enfim, posso dizer e concordar com Kramer (1995), pois, tem razão quando diz que as “informações [em referência a representação de infância européia] não podem ser mecanicamente transpostas para a sociedade brasileira dada a diversidade de aspectos sociais, culturais e políticos que interferiram na sua formação. Dentre tais aspectos, pode-se citar a população indígena original, as diferentes migrações, o longo período de escravidão, o imperialismo imposto pelos países europeus e o impingido pelo Brasil a outros países latino-americanos.” Das palavras de Kramer volto (a memória: Chartier) aos índios do Brasil, quem sabe, é o meu inconsciente em busca dos arquéticos (Jung)! Por fim, entre questões apontadas e não apontadas, na verdade, urge tentar levantar mais a sociologia da infância verde-amarela a se insurgir mais fortemente, ou, a sociologia da infância pós-colonial, enfim, qual será nossa densa e específica construção a visibilizar nossas culturas infãntis singulares e específicas?

Educação e Infância: discussões contemporâneas (2)



Crianças e Infâncias 
 
No texto anterior falava-se um pouco sobre os lugares em que se ocupam os pesquisadores com crianças e infâncias. Notou-se muitas produções, por sua vez, podendo serem organizadas ou sistematizas segundo o interesse. Mas há uma questão que se coloca em tantas produções, no sentido do curto tempo desse novo campo, pois, devido os diversos modos e maneiras de pesquisas infantis, segundo Jobim e Souza e Pereira (1998) é possível identificar as tendências que vão surgindo sobre o cientificismo em torno das infâncias a produzir o que os autores denominam de “racionalização da infância”. Talvez, é nesse aspecto que Agamben (2005) pode relacionar a origem da história como saber que destrói a experiência da infância e da sua linguagem. Na verdade, se essa é a questão, a história da educação flexiona com a sociologia da educação, ou melhor, sociologia da infância, tais categorias - criança e infância – que são contrastadas no sistema de educação, por efeito, gera-se a construção cada vez maior de teorias e diversos modos de tratamento ao tema. E este levantamento de questões críticas desta vontade de saber ao modo científico, segundo Quinteiro (2005), pode destacar algumas demandas metodológicas emergentes, pois, “pouco se sabe sobre as culturas infantis”, aliás, fato que se apresenta à maneira de contrariar as produções do meio (acadêmico), já que são diversas e muitas, como se mensura; porém, o problema surge de outro modo, pois, não se permite dar à criança espaço à sua voz (ou fala) como também, segundo Quinteiro (2005), não se confia no testemunho da criança, principalmente, aquela do Ensino Fundamental. Inclusive, pouco se conhece também, continua a autora, sobre as relações de poder entre o adulto e a criança, outra provável falha metodológica, como pude constatar no texto anterior a este, aliás, essas problematizações fazem parte da complexidade de metodologias, teorias ou abordagens sobre esse grupo social, deveras, muito especial.